sexta-feira, 14 de março de 2014

"Amigo, às vezes tenho tantas coisas pra te contar, que nem sei bem por onde começar. Mas queria te dizer que, sobretudo, é difícil entender o coração da gente. Viver é uma coisa que me assusta cada dia mais, mesmo tendo ainda toda essa coragem de principiante sonhador, em desbravar esse mundo por ai a fora.
Tenho vivido os dias que seguem cheio de fome. Tenho tido sede. Mas não de qualquer alimento, ou água fresca. Ando com o estômago remexido, como se um furacão houvesse passado por aqui. Tenho dormido tarde, isso quando durmo, pensando, planejando, fazendo de conta, contas. Tenho tentado esquecer de me lembrar.
Tenho fome de paixão. De abraços apertados, abarrotados de silêncio. De beijos no meio das falas. De mãos dadas, agarradas, de conversas fiadas, daquele “bom dia” cheio de segundas intenções.
Engraçada essa vida que a gente leva, né? Seguimos com as cabeças erguidas, julgando sermos donos dos próprios narizes, achando que quaisquer cafés requentados, pizzas congeladas e refrigerantes, encham a barriga da gente. Como se só comer hambúrguer livrasse a alma do peso. Como se comida japona tivesse o gosto da felicidade, ou que batata-frita fosse como um beijo de amor roubado.
Ah, quantas coisas a gente come achando que esse vazio que fica por dentro, é fome... E aqueles potes de sorvete, feito filmes de meia idade, com música triste e cobertor?! Dão a sensação mais completa do que é sentir fome de paixão. De amar. De ser platônico. De sentir aquele coração acelerado e frio na barriga só de ver alguém passar.
Percebi, há pouco tempo, amigo, que minha fome é de atenção. Entendi que cada um busca no outro, um punhado do que lhe falta, e só por isso que as pessoas se relacionam. Ninguém se basta por ser si. Ninguém é tão redondo que não tenha uma beira pra encaixar uma peça que por ventura lhe falte.
Vemos nos outros, nos seus reflexos e companhias, pedaços essenciais que julgamos faltar nas nossas felicidades. Por isso que carência é um bicho-papão. Ela faz a gente enxergar feito míope. Olhamos pro borrão, e vemos exatamente o pedaço que falta. Daí em diante, seguimos como bêbados, embriagados, que estão com as chaves do carro, tentando abrir a porta de casa.
Todo encontro, todo relacionamento, todo caso, devia ter antes de tudo, uma entrevista, quase como as de emprego. Algo que dissesse mais ou menos assim: “Oi, sou fulano e procuro isso, isso, isso, esse isso também, um pouco disso, aquele aquilo, e só mais isso, em alguém, se você puder me oferecer, podemos ficar juntos. Se não, olha, tem gosto pra tudo nesse mundo, acredito que sua metade não seja eu, mas, boa sorte”. Seria tão mais fácil. A gente se pouparia de tanta coisa, não é mesmo?
Mas não. A vida não dá tempo pra entrevistas de empregos pras vagas do coração, ou até dá, nós é que temos sede por mão de obra capacitada, e acabamos por contratar em regime de experiência, os primeiros candidatos que surgem por ai.
Amigo, tenho fome de paixão. Tenho percebido nos últimos tempos, o quanto é difícil dizer “eu te amo”, de verdade. Não aqueles fúteis, vazios de lógica, de sentido, que a gente ouve todo dia por ai. Tenho sentido, cada dia mais, dificuldades em amar alguém, só pelo fato de que as pessoas não se deixam amar.
Veja a que ponto o mundo chegou. As pessoas estão tão ocupadas inflando os seus egos, que não deixam mais espaços para que nós as amemos. Antes de receber carinho, é preciso observar o mundo todo, esgotar todas as possibilidades, pra só depois que a rotina esmagar os dias e a carência for mais forte, ufa, deixar, alguém, simplesmente, te amar.
Tenho vivido os dias que seguem cheio de fome. Tenho tido sede. Tenho buscado um alimento que não importa qual seja a fartura, me faça o escolher. Acho isso tão importante. Vivemos em um mundo plural, onde a oferta é maior que a procura, onde para cada ser humano, existem bilhares de tentações, mas, sinto falta, de algo que me faça resistir a todas.
Amigo, às vezes tenho tantas coisas pra te contar, que nem sei bem por onde terminar. Mas queria que soubesse que apesar do medo que ronda meus dias, a coragem é minha maior companheira. Descobri que sou maior que os meus sonhos. Levo minha felicidade tão a sério, que prefiro ser só, a não ser feliz."
(Matheus Rocha)

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